De acordo com Santiago Cornejo, diretor de Engajamento com os Países do consórcio Covax Facility, que distribui imunizantes contra Covid-19 a países pobres através do financiamento por parte de nações mais favorecidas, a pandemia não chegará ao fim se a terceira dose da vacina for dada em países ricos e de média renda antes do avanço da vacinação da população nos países menos favorecidos.
Segundo Cornejo, ao menos 20% da população de todos os países precisa ter acesso à vacina contra Covid-19, para que a pandemia recue. Para isso, o Covax precisa distribuir mais de 1,7 bilhão de doses, enquanto, até o momento, o consórcio entregou 200 milhões de doses.
Ainda que o número de doses de vacinas aplicadas em todo o mundo supere 5,4 bilhões, menos de 50% da população sequer recebeu a primeira dose do imunizante. Em países de baixa renda o cenário é ainda pior, com apenas 1,8% da população totalmente imunizante, de acordo com dados da plataforma Our World in Data, da Universidade de Oxford.
“É fundamental que continuemos as pesquisas para desenvolver nosso conhecimento sobre vacinas e sobre essa doença. E, cientificamente, o que sabemos até agora é que a vacinação completa protege o suficiente mesmo contra as variantes, como a Delta, evitando internações graves e mortes. A prioridade máxima do mundo deveria ser garantir que cada país tenha vacinas suficientes para cumprir o esquema vacinal atual, e é isso que defendemos”, disse Cornejo, em entrevista ao Estadão.
“É isso que vai permitir evitar internações. Assim que tivermos mais suprimentos, assim que alcançarmos essa cobertura mínima em todos os países, poderemos ver como aumentar a proteção com doses extras. Se os países começarem a usar os escassos suprimentos para aplicar uma terceira dose agora, a disponibilidade de vacinas ficará ainda mais limitada”, explica.
Desigualdade na vacinação contra Covid-19 pode gerar novas variantes
O acesso desigual às vacinas pode também gerar novas variantes do coronavírus, na avaliação de Cornejo. “Sempre dizemos que precisamos vacinar muito no mundo inteiro. Não podemos ter bolsões de pessoas não vacinadas. Não vai ser apenas um país ou uma região que irá derrotar a pandemia. Isso é impossível, o mundo hoje é conectado, as pessoas se movimentam. Precisamos de uma solução global”, avalia.
“Precisamos de vacinas para as populações de risco. Ainda há muitos países que não conseguiram vacinar grupos como profissionais de saúde, trabalhadores da linha de frente, idosos e pessoas com comorbidades. Essa é a nossa prioridade e deve ser a prioridade do mundo inteiro”, acrescenta.
Enquanto a vacinação caminha no Brasil, outros países chegaram a um platô e não conseguem avançar no número de vacinados, como é o caso dos Estados Unidos, onde apenas 64% da população adulta completou o esquema vacinal, apesar de o país ter começado a vacinação em dezembro de 2020. Cornejo culpa a desinformação.
“É triste ver isso em uma pandemia que tira muitas vidas. Uma das causas dessa hesitação é a desinformação e a propagação de notícias falsas. Isso tem um impacto terrível e não podemos pagar por isso. Precisamos que todas as partes envolvidas trabalhem juntas. Não se trata de uma única pessoa, mas sim da sociedade. A solução é: comunicação, comunicação e comunicação. Precisamos que os países forneçam evidências científicas, de modo simples, para que as pessoas possam entender a importância da vacinação.”, diz o especialista.